BAGA FORMAÇÃO DE NAVEGADORES DE RECREIO
Outubro 09, 2019
Tarcísio Pacheco
foto: Tarcísio Pacheco
BAGAS DE BELADONA (81)
HELIODORO TARCÍSIO
BAGA FORMAÇÃO DE NAVEGADORES DE RECREIO – Como esta semana vão todos fazer análises dos resultados eleitorais e do abstencionismo, vou continuar a surfar a minha onda contra corrente e aproveitar para escrever sobre algo que me é caro e próximo.
Sou sócio fundador do Angra Iate Clube (1995) e formador da sua Escola de Formação de Navegadores de Recreio desde 1998, com base na minha condição de Patrão de Costa desde 1984, Yachtmaster Ocean (shorebased course, Reino Unido, 2018, através de escola certificada pela Royal Yachting Association), skipper em embarcação própria, velejador com experiência oceânica de longa distância e formador licenciado, com certificação pedagógica pela Universidade dos Açores. Este período inicial justifica-se apenas por entender que as pessoas devem comprovar que sabem do que falam.
Ao longo da minha prática como formador nesta área, tenho vindo, por assim dizer, a especializar-me no curso de Patrão Local, de longe o mais procurado pelos navegadores açorianos. Contam-se por centenas os candidatos que formei a este nível, com índices de aprovação próximos dos cem por cento.
Normalmente, só quando as pessoas pensam em adquirir uma embarcação é que se lembram que, se ainda não o sabem, precisam de aprender a manobrá-la e de obter uma licença náutica, vulgo “carta”. A legislação portuguesa atual, alterada em 2018, obriga os cidadãos a obterem certificação formal numa das quatro categorias existentes (Marinheiro, Patrão Local, Patrão de Costa e Patrão do Alto) para poderem pilotar uma embarcação de recreio em águas portuguesas. Além disso, as licenças portuguesas, bilingues na atualidade, são válidas em toda a CE e aceites um pouco por todo o mundo. Embora as exigências variem noutros países, a tendência atual a nível mundial é tornar obrigatório algum nível de certificação, por questões de segurança e como reação à multiplicação de embarcações de recreio de todos os tipos e ao enorme aumento de tráfego neste sector. Dentre os candidatos açorianos, encontra-se quem diz que vai ao Continente “comprar uma carta”, quem prefere alinhar em “cursos intensivos” e quem vem ter com o Angra Iate Clube para obter formação séria e paciente, sem pressas. São os que valorizam a aprendizagem tanto quanto “a carta”.
Como é natural, o meu percurso como formador evoluiu, ao longo destes vinte e um anos. Creio que hoje em dia leciono um curso de Patrão Local bem estruturado, completo e totalmente assente no currículo formal publicado para este nível de aprendizagem, estando, obviamente, preparado para lecionar outros níveis. No entanto, julgo que as pessoas fazem alguma confusão com a formação e é por isso que partilho esta reflexão.
Não acredito em cursos “intensivos” nesta área como os oferecidos por outras escolas. Menos ainda acredito em formação para “exame”. Os conteúdos são densos e o seu domínio exige um período de tempo conveniente e alguma prática. Como explico sempre aos meus formandos, a carta de Patrão Local acarreta grande responsabilidade já que, nos Açores, permite, por exemplo, comandar uma embarcação que pode ser até de grande porte, entre as ilhas do Grupo Central (e para os outros Grupos sob autorização expressa e pontual do Capitão do Porto) podendo navegar de noite e transportando, usualmente, pessoas próximas como amigos e familiares, incluindo crianças. Um exame é apenas a aferição de um certo nível de conhecimento pessoal num dado momento. Uma licença é apenas um pedaço de papel. Nem um curso nem uma carta fazem de ninguém um navegador competente e responsável. Muito menos um curso intensivo e uma carta obtida de forma discutível. Apenas a consciência individual, o sentido da responsabilidade, o investimento pessoal na aprendizagem e uma prática alargada podem formar, no tempo adequado, um navegador de recreio competente.
É por isso que os meus cursos não são intensivos, duram cerca de dois meses. As pessoas têm tempo de aprender e praticar. É por isso que os meus cursos são focados na aprendizagem e não na preparação para o exame, que ocorre, ao longo do processo, de forma natural. É por isso que os meus cursos implicam aulas práticas no mar, dentro do possível, com os meios disponíveis.
Acredito no processo de ensino/aprendizagem e não na “preparação para exame” à antiga portuguesa. Pior ainda é o autêntico comércio de licenças náuticas que em alguns locais se pratica, com a conivência de quem deveria fiscalizar e garantir a legalidade e a qualidade do ensino.
Se algum dia a entidade com quem colaboro há 21 anos deixar de se conduzir pelas premissas que enunciei, de certeza que termino aí a minha carreira de formador nesta área. popeye9700@yahoo.com