I LOVE YOU SO MUCH DEAR MR. TRUMP (Take 1) (BB 160)
Janeiro 02, 2025
Tarcísio Pacheco
BAGAS DE BELADONA (160)
HELIODORO TARCÍSIO
BAGA I LOVE YOU SO MUCH DEAR MR. TRUMP (Take 1) - Recentemente, aproveitando o muito generoso e aparentemente ilimitado palco disponibilizado pelo Diário Insular, o Dr. Manuel Bettencourt, ilustre médico dentista da Califórnia e emigrante açoriano da ilha Graciosa, usou quatro páginas completas deste jornal, para publicar um fervoroso auto de amor pelo seu herói, Donald Trump. De quem, ingenuamente, diz que “(…) Ninguém é perfeito neste mundo. O Trump tem os seus defeitos como todos nós”. Claro que qualquer um poderia usar as mesmíssimas palavras para se referir a Joe Biden ou a Kamala Harris (sem o deselegante artigo definido…), que o Dr. Bettencourt demoniza, responsabilizando-os por todos os males de que sofre a América atual. É uma expressão vaga e tonta, que é habitualmente utilizada para desculpar quem queremos inocentar de culpas, incluindo nós próprios. Em última análise é aplicável a qualquer um, incluindo Vladimir Putin.
Sinceramente, nem sei por que ponta pegar no artigo de opinião do Dr. Bettencourt porque todo ele é altamente criticável e repleto de informação deturpada, exagerada ou simplesmente falsa. Precisaria das mesmas quatro páginas que ocupou no DI para um comentário completo e a preceito. E acho que não devo fazer isso, nem o DI, provavelmente, me daria o mesmo palco.
O Dr. Bettencourt não precisava de ter invadido e ocupado o jornal da ilha para nos dizer que é um apoiante indefetível de Trump. Mas invadir e ocupar é o estilo desta gente do MAGA. Sabemos todos que a maioria dos emigrantes açorianos nos EUA, especialmente os de primeira geração, vota em Trump. E também conhecemos as razões para isso. Que não são nada lisonjeiras para a comunidade. Do Dr. Bettencourt, que andou na faculdade a estudar medicina, esperar-se-ia bastante mais e melhor. No mínimo, que não se limitasse a papaguear as atrocidades néscias e sofismas maliciosos com que Trump, os seus aliados e os hackers russos inundaram as redes sociais. Mas é sobretudo isso que o Dr. Bettencourt fez, espalhando pelo meio, uma caterva de números selecionados criteriosamente para reforçar os seus pobres pontos de vista.
Afirma o Dr. Bettencourt que foi “20 anos do Partido Democrata”, mas que este se radicalizou nos últimos anos, numa deriva para a esquerda. Só a discussão disto já dava uma tese académica. Para se perceber porque é que naquela que costuma ser considerada “a maior democracia do mundo”, o debate político e ideológico é tão pobre que os eleitores se reveem apenas em dois partidos. Não é um regime de partido único, mas é um regime de dois partidos únicos. Como é único o sistema eleitoral norte-americano, que satisfaz os eleitores dos EUA, mas parece ser cada vez mais suspeito e pobre para o resto do mundo livre. Outra coisa que o Dr. Bettencourt não parece compreender é que o que nos EUA passa por ser “mais de esquerda”, para as democracias evoluídas do mundo, é apenas “um pouco menos de direita”, já que sempre imperou no país um absoluto primarismo político-ideológico e um claro alinhamento à direita. Não há esquerda política nos EUA. Incrivelmente, o que o Dr. Bettencourt mais abomina nos democratas é que se tenham afastado mais ainda do tradicional discurso republicano. O Dr. Bettencourt não parece gostar da diferença e da diversidade de opiniões, ele é todo pelas ovelhinhas brancas. Até porque as ovelhinhas pretas devem ser imigrantes mexicanos, ilegais, claro.
Outra coisa que o Dr. Bettencourt nos diz é que os democratas “(…) são capazes de tudo e mais alguma coisa para se manterem no PODER” (sic). Não me diga, é mesmo assim? Tipo quê, tipo não aceitar resultados de eleições e decisões judiciais legítimas e promover e incentivar a invasão, com destruição, feridos e mortos, da sede de algum órgão de soberania, tipo, o Capitólio? Xiii, realmente, o caso é grave e até já lhe dou alguma razão, que patifes criminosos!
E o Dr. Bettencourt segue por ali abaixo, num ritmo frenético e nauseante, parecendo entender pouco para além das técnicas dentárias. Não entende, por exemplo, que está em curso um ataque feroz e sem precedentes aos regimes democráticos do mundo livre, à união e cooperação entre eles e à sua expressão militar, que é a aliança defensiva da NATO. Este tema é muito bem tratado pelo escritor e jornalista, José Rodrigues dos Santos, no seu livro mais recente, Protocolo Caos. Claro que para a mentalidade básica do Dr. Bettencourt, este insuspeito escritor deve ser “comunista”. Esse ataque é perpetrado sobretudo pela Rússia, mas também pela China, Irão e Coreia do Norte, ou seja, pelas principais ditaduras da atualidade. Alguma vez o Dr. Bettencourt parou para pensar porque é que Trump é o favorito de Putin nos EUA? Nada disto é simples, mas uma das razões é o ataque sistemático de Trump à comunicação social livre e independente, preciosa em democracia, de que o Dr. Bettencourt faz uma obediente e acéfala crítica. Papagueando Trump, o Dr. Bettencourt acha que a maior parte dos media americanos é mais ou menos “de esquerda”, com a CNN à cabeça e com poucas exceções, entre as quais, se destaca, obviamente, a Fox News, controlada pelos conservadores, de quem Trump disse ser a única estação que diz a verdade. Na Rússia, Putin deu cabo de todos os media independentes, através dos seus métodos usais, assassinato simples à cabeça, mas também encarceramento, encerramentos compulsivos, processos criminais e outros métodos agressivos, restando apenas os órgãos formais, subservientes ou totalmente alinhados. Assim, Putin, evita qualquer crítica ou oposição. Nos EUA, Trump declara a maioria dos media “de esquerda” e mentirosos, ou seja, todos os que ele acha que o prejudicam e estipula que apenas alguns, como a Fox News dizem a verdade. E, para além disso e sobretudo, privilegia as redes sociais como meio principal de comunicação. Toda a gente sabe que o Twitter era o seu principal canal de comunicação com o país e com a sua rede de apoiantes. E depois, como o Twitter, apesar da sua enorme elasticidade, também tinha os seus limites, acaba por formar a sua própria rede social, de onde ninguém o pode expulsar e que ele controla totalmente. E porque é que Putin e Trump fazem ambos a mesma coisa? Porque sabem muito bem que as redes sociais são selvas de onde estão totalmente ausentes quaisquer critérios de ética, verdade, justiça ou deontologia profissional. Nas redes sociais, qualquer um pode vomitar o seu próprio veneno, sem que nada lhe aconteça, pelo menos nos EUA (em Portugal e na CE já não é bem assim por estar criminalizado o incitamento ao ódio e à violência). Por outro lado, nas redes sociais, impera o anonimato cobarde. Além disso, é muito fácil, com as tecnologias atuais e as enormes e bem preparadas redes de hackers, com propósitos muito sombrios, criar perfis falsos e espalhar mentiras e boatos à fartazana. Um método relativamente simples e bem conhecido é, por exemplo, a respeito de uma qualquer das muitas tolices e mentiras que Trump escreve nas redes sociais, colocar uma série de comentários favoráveis com origem em perfis falsos. Isso gera um movimento de bola de neve e a partir de certa altura, começam a aparecer em catadupa os comentários favoráveis de verdadeiros americanos, encorajados pelo que vão lendo. Parece haver um enorme apoio popular a Trump e, às tantas, já há mesmo, o processo nunca mais para, já teve a sua ignição artificial. Obviamente, isso vai ampliando o campo de recrutamento e criando a “aura de Trump” como um grande “patriota”, the man for the job. O propósito de toda esta verdadeira sabotagem é simples e medonho ao mesmo tempo, é semear o caos e a discórdia no Ocidente, é levar a América ao descalabro, é criar fossos e divisões entre a América e a Europa, é desmembrar a aliança atlântica. E assim, Trump, que se julga muito inteligente, vai fazendo, ingenuamente, o jogo de Putin. O movimento do “America First” só aparentemente beneficia os EUA e prejudica muitos outros países, nomeadamente os da CE e o Canadá. Na verdade, qualquer processo isolacionista prejudica toda a gente. Não há ação sem reação, uma das regras mais simples de entender do Universo. Mas Trump não tem faculdades intelectuais, bom senso básico ou perfil de estadista para entender isso.
Para terminar esta parte, vou dar um exemplo de como o arrazoado do Dr. Bettencourt está cheio de patranhas. Diz ele que os media de esquerda “encobriram o problema cognitivo do presidente Joe Biden”. Ora, isso é absolutamente falso. Biden tinha realmente um problema de desempenho mental, causado, muito provavelmente, pela sua avançada idade. Mas, quando esse problema se tornou patente, nomeadamente a respeito do desempenho de Biden no seu último debate com Trump, o facto foi amplamente noticiado, inclusive pela CNN e por muitos outros órgãos, nos EUA e por todo o mundo. Leio notícias todos os dias, na comunicação social, procurando fontes diversificadas e evitando as redes sociais, que uso para outras coisas, nomeadamente para uma socialização saudável. Todos os media falaram nisso, mostrando imagens. Foi mesmo a grande notícia por algum tempo. Porque era inegável, porque era notícia, porque era informação relevante e porque não havia qualquer motivo para o esconder, pelo contrário.
Para não ocupar demasiado espaço no jornal, ficarei por aqui agora, mas voltarei ao tema. O Dr. Bettencourt merece. Apesar de tudo, desejo-lhe um Feliz Ano Novo, por ser um açoriano. Já a Trump, desejo-lhe um Péssimo Ano Novo. Se bem que ele não precisa dos meus desejos nefastos, ele é bem capaz de tratar disso sozinho, como já se viu, ao criar problemas ainda antes do início do mandato, com vizinhos e amigos como o Canadá, a Dinamarca, o Panamá, toda a Comunidade Europeia e com a NATO. POPEYE9700@YAHOO.COM