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popeye9700

Crónicas e artigos de opinião, a maior parte publicada no Diário Insular, de Angra do Heroísmo.

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Crónicas e artigos de opinião, a maior parte publicada no Diário Insular, de Angra do Heroísmo.

BAGA DEIXEM O ENTRUDO EM PAZ (BB97)

Fevereiro 11, 2020

Tarcísio Pacheco

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BAGAS DE BELADONA (97)

HELIODORO TARCÍSIO

 BAGA DEIXEM O ENTRUDO EM PAZ - Por estes dias, ficámos a saber que a tia Rosa já passou os 80 mas está fresca que nem uma alface; que quis ir comemorar o aniversário num cruzeiro e que se dispunha a deixar o marido em casa porque assim como assim “nunca quer ir para lado nenhum”; que levou a filha para lhe fazer alguma companhia, mas que a lambisgoia não fez outra coisa que não fosse atirar-se ao comandante, naquela velha paixão por fardas. Que a tia Valquíria fica agarrada ao feissebuque todo o santo dia, atenta a tudo o que é publicação e comentário na freguesia; que montou espera ao carteiro porque, entusiasmada,  mandou vir cerâmica erótica de Caldas da Rainha (e o carteiro que não havia maneira de chegar…); que, farta de trabalhar, deixa a lide de casa toda por conta da filha e que esta, talvez por desfastio, embora nunca faça transpirar o marido, é vista a sair diariamente com abundante transpiração da casa de um tal João, não constando que pratiquem Zumba por lá. Que as fardas da marinha são bem garbosas (neste bailinho é que a filha da tia Rosa se ia consolar); que um rapaz do meu tempo de Liceu que sempre conheci por Borges, tem um vozeirão bem afinado, destinado a gritar ordens num convés, mas que fica igualmente espetacular a cantar em cima de um palco. Que muitos velhinhos são abandonados pelas famílias nos lares de terceira idade e que nem todos são bem tratados por lá. Que uma senhora que tem, naturalmente, uma cara cómica, é capaz de fazer uma belíssima rábula da Beatriz Costa. Que a incrível escola de pandeiros de Santa Bárbara está bem viva e nos mostra um maravilhoso, saudável e cada vez mais raro convívio intergeracional. Que muitos idosos têm uma memória que causa inveja aos mais novos. Que velhos são os trapos; que enquanto por aqui se anda, com um mínimo de saúde, é fundamental celebrarmos a aventura da vida; que não há nada melhor para isso do que a música, a dança e o riso.

Tudo isto são apontamentos do Carnaval Sénior da ilha Terceira de 2020, a crescer a cada ano em qualidade e popularidade, cada vez mais uma introdução obrigatória ao nosso carnaval. Uma espécie de saborosa entrada antes do prato principal.

Classificar o nosso carnaval como Património Cultural Imaterial está muito bem. Não é mais do que reconhecer, com toda a justiça, a importância e relevo desta festa entre nós, vivida de um modo único.

Quanto ao resto, confesso que tenho medo. Há duas manobras que estragam facilmente as coisas boas da vida: excessiva regulamentação, quase sempre com o pretexto da “segurança” e economicismo, fazer passar tudo pela ótica do lucro. Devemos deixar o Carnaval terceirense fluir naturalmente, permitindo que as pessoas organizem as coisas como sempre fizeram. Há inovações naturais porque a vida é assim mesmo, um processo imparável de evolução. E nenhuma discussão pode ser proibida, é sempre salutar trocar ideias e auscultar diferentes opiniões e sensibilidades. Por outro lado, devemos estar atentos a situações que podem começar a matar o Carnaval terceirense, nomeadamente as transmissões pela Internet. Quanto a isso, não tenho muitas dúvidas. Os cenários naturais das nossas danças e bailinhos de Carnaval são os salões das sociedades recreativas espalhados pela ilha. Essas salas têm de estar cheias e animadas. Por isso, as transmissões em direto, salvo raras exceções, são perniciosas e devem evitar-se.

Além disso, gela-se-me o sangue quando vejo associar turismo e Carnaval ou começam a circular conceitos como “exploração turística” ou “rentabilização económica”. Se algum dia começarem a aparecer “pacotes” do Carnaval terceirense para turistas ou se montarem bailinhos em espaços grandes especificamente para turistas, será o princípio do fim.

Nunca vi o Carnaval terceirense como vendável turisticamente. As danças de Carnaval envolvem música e dança, expressões artísticas universais, mas passam sobretudo pela comédia satírica em português. Por isso, logo aqui, a limitação da língua é fundamental. Começamos a ter turistas todo o ano e isso é, provavelmente, um fenómeno imparável, à escala mundial, limitado apenas por questões de segurança e de clima. Mas o turismo desenfreado e sem limites já começa a trazer problemas graves, um pouco por todo o mundo. A solução não é proibir nem censurar, mas sim usar diferentes mecanismos para criar equilíbrios, sem inventar muito.

Sempre fomos hospitaleiros e devemos continuar a sê-lo, até porque, cada vez mais, todos somos turistas de vez em quando. Mas, no que respeita ao Carnaval, os turistas é que têm de se adaptar às nossas práticas, não é o nosso Carnaval que se deve tornar “turístico”. Por isso é que digo, deixem o Entrudo em paz, não inventem.popeye9700@yahoo.com

 

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