BAGA TAUROMÁQUICA 1
Dezembro 04, 2018
Tarcísio Pacheco
imagem em: https://www.canstockphoto.pt/forte-touro-13042762.html
BAGAS DE BELADONA (60)
HELIODORO TARCÍSIO
BAGA TAUROMÁQUICA 1 – Foi com prazer que percebi ter a questão do IVA nas touradas despoletado alguma reflexão pública sobre o tema da tauromaquia. Isso anima-me a partilhar as minhas humildes opiniões.
Eu sei que sou difícil porque não consigo ver a preto e branco, sou todo arco-íris (sem conotações sexuais). Assim, não tenho opiniões simples sobre touradas ou outra coisa qualquer. As opiniões simples são próprias dos simplórios. A vida neste planeta é complicada.
Não tenho nenhuma simpatia especial pela Ministra da Cultura. Nem vou soltar foguetes por ela ser lésbica, isso seria o preconceito ao contrário. Para já, parece-me que lhe faltam ali uns filtros e alguma discrição. Independentemente disso, continuo a reconhecer-lhe o direito de dizer o que pensa sobre touradas ou sobre outra coisa qualquer e também de tentar provocar mudanças. De resto, corrijam-me se estiver errado, quem manda no país é a Assembleia da República, eleita por nós todos e quem produz as leis a que todos temos de obedecer. O Governo executa essas leis, governando. Por algum motivo, ao governo se chama “o executivo”. A Ministra pode dizer o que quiser, mas está ali para executar. Em termos legislativos, o poder dela é zero e até responde perante o parlamento. Por outro lado, detesto a típica hipocrisia política (não dizer o que realmente se pensa, falar para agradar ao eleitorado ou para obedecer ao líder partidário) e tenho de concordar com a Gracinha, doa a quem doer. Continuar a ter touradas ou não é uma questão de civilização, pois claro que é. As tradições em que se humilha, magoa, tortura, fere e mata animais foram sempre muito populares pelo mundo fora. Muitas continuam ainda em execução (massacre de cetáceos, lutas de galos, lutas de cães, mutilação de rinocerontes, espetáculos circenses, caça à raposa e touradas… entre muitas outras). E vou deixar de lado aqui toda a pavorosa miséria em que consiste a criação industrial de animais para abate e consumo. Mas, apesar de toda a porcaria da raça humana, basta olhar para a História e percebe-se um pulsar de evolução…civilizacional. Que passa por reconhecer direitos aos animais e ir acabando com todas as formas de sofrimento animal gratuito (para divertimento humano – sem claros fins alimentares). Foi assim que muita coisa foi mudando ou sendo amplamente contestada pelo mundo fora nos últimos anos: o massacre de cetáceos, a aristocrática caça à raposa na Inglaterra, a contestação ao vestuário com peles naturais, a tortura de gansos para produzir o foie gras, entre muitos outros exemplos. E as touradas estão a começar a ser fortemente contestadas nos países onde são legais. Tudo isso é uma questão de civilização.
Acredito que, pelo menos as touradas de praça vão acabar um dia. Poderá ser daqui a muito tempo ainda mas é inevitável. Isso não irá acontecer de forma isolada, mas num quadro geral de evolução das sociedades. Para cima e para a frente é que o caminho e o ser humano do futuro (se houver futuro…) não vai querer causar nenhum tipo de sofrimento animal. Nós somos diferentes de todos os outros habitantes do planeta; na Natureza não há crueldade, mata-se para sobreviver, sendo os instintos mais fortes, alimentar-se e reproduzir-se. Sendo os seres mais inteligentes do planeta, nós, humanos, temos de ser superiores aos instintos naturais.
Sou aficionado e democrata. Sou também crítico e autocrítico, tendencialmente vegetariano e não vejo nisso qualquer incoerência. Acredito que devemos viver de acordo com as ideias da maioria, embora respeitando os direitos das minorias, tanto quanto possível, desde que representem valores democráticos e que respeitem a lei e a nossa Constituição. O Portugal do séc. XXI continua a ser um país em que uma maioria da população gosta de touradas. Enquanto isso não mudar, as touradas devem continuar a acontecer e serem encaradas como qualquer outra tradição cultural e espetáculo público. Quando deixar de ser assim, então teremos mudado enquanto povo, seremos outros e tomaremos diferentes decisões. Acredito que as transições civilizacionais acontecem no seu tempo próprio, refletindo o nível de cultura, educação, informação, espírito crítico e consciência moral de cada período histórico. Não devem ser bruscas, autoritárias nem impostas à força. Mas que haja sempre tolerância, abertura para o diálogo, discussão e troca de ideias respeitosa e pacífica. Conto referir-me mais tarde, em futuras bagas, à tourada de praça e à tourada de corda terceirense.POPEYE9700@YAHOO.COM