BAGA MENINA APOCALÍPTICA???
Outubro 04, 2019
Tarcísio Pacheco
imagem em: https://zap.aeiou.pt/greta-thunberg-trump-ouvir-mais-ciencia-276738
BAGAS DE BELADONA (80)
HELIODORO TARCÍSIO
BAGA MENINA APOCALÍPTICA??? – Os artigos regulares do correspondente permanente do DI na Escandinávia são dos poucos que leio sempre. O homem é cronista talentoso, investigador diligente e dono de uma cultura superior. É também um interessante divulgador da história e cultura nórdicas. E não deixa de ter a sua pitada de humor, o que é, quase sempre (há exceções, lembrei-me agora do “cómico” Fernando Mendes…) sinal de inteligência. Fiquei agradecido por ter trazido ao meu conhecimento um certo arquipélago finlandês que fiquei com vontade de visitar, já que, nascido ilhéu, em cima de umas sacas de sarapilheira, a 25 metros do mar, numa fajã jorgense, adoro ilhas.
Porém, nem sempre estamos de acordo, o que é salutar e, o mais das vezes, absolutamente irrelevante. O certo é que, recentemente, o prezado articulista chamou “menina apocalíptica” a uma certa menina sueca a quem eu prefiro chamar Grethe, o nome dela, ou, na pior das hipóteses, “musa do clima”.
Sempre num registo de escrevinhação superior, o articulista foi deselegante e deixou transparecer um tom desdenhoso. Se queria falar das alterações climáticas, tinha bem à mão as intervenções desbocadas e trauliteiras de Trump, o assassino do clima ou as tiradas imbecis e agressivas de Bolsonaro, o incendiário da Amazónia. E se queria encontrar culpados, talvez pudesse ter falado de nós todos, eu e ele incluídos e do nosso apetite por consumismo, viagens aéreas, energia elétrica, petróleo e eletrónica. Mas não, tinha que falar de Grethe, chamar a família dela ao terreiro, insinuar que ela é um poucochinho deficiente, que se arma em profetisa e dar relevância ao facto de ter interrompido o seu percurso escolar para encetar uma cruzada messiânica. Até com o apelido dela, Tintin, o articulista entendeu gozar. Isto caiu-me mal.
Considerações irrelevantes à parte, tenho total admiração por esta menina de 16 anos que, em vez de se empenhar na escola para “obter sucesso num mundo cada vez mais competitivo”, tralala, tralala, um dos mais caros mantras da sociedade capitalista e consumista, supera os seus constrangimentos naturais e parte, mundo afora, numa corajosa, mas espinhosa missão de nível superior, para alertar o mundo sobre o que pode estar para vir em breve.
Não sei se estamos à beira de um cenário de apocalipse até porque nunca assisti a nenhum ainda. Mas quer-me parecer que uma boa definição de apocalipse é a de um somatório de catástrofes interligadas, já ocorridas, em curso ou anunciadas, com efeito final, irreversível, de avalanche. E disso já há indícios bastantes. Não sou eu, um desconhecido sem importância, quem o diz. É 97% da comunidade científica mundial, de uma forma ou de outra. Em 1988 foi criado o IPCC (Painel Intergovernamental sobre as Mudanças Climáticas) sob a chancela da Organização Meteorológica Mundial e do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, que passou a publicar grandes relatórios periódicos. O IPCC estabeleceu-se como o principal porta-voz do consenso científico e como a maior autoridade mundial sobre o aquecimento global. A súmula das suas conclusões é de estarrecer e bastante “apocalíptica”. No topo da lista pode ler-se que “o aquecimento global da Terra é inequívoco” e que “a influência humana sobre o clima é clara”.
Mas o nosso gracioso articulista entendeu que Grethe Tintin faz mal em andar por aí a alertar o mundo e que deve ser gozada, que, se calhar, os pais, meio extravagantes, é que estão por detrás disto tudo e que a jovem Grethe faria melhor em andar agarrada ao seu iphone topo de gama como os outros todos, a ver cenas maradas e assim, a beber uns copos à noite (despautérios de juventude, quem os não teve), a aproveitar as excelentes oportunidades que o programa Erasmus oferece (é possível, por exemplo, escolher o país de destino mediante o preço local da cerveja) e a tratar dos seus desequilíbrios emocionais, a ver se chega a casar um dia. Até já se está a fazer ao piso ao Nobel da Paz e assim ainda atrapalha a candidatura autoproposta de gente adulta e séria, como o Sr. Donaldo.
Felizmente, para o mundo, Grethe Tintin é de outro calibre. Aguardemos as cenas dos próximos capítulos enquanto nos preparamos para lidar com o caprichoso Lorenzo, o maior ciclone atlântico, até agora, a escolher uma rota Norte. Não deixem roupa no varal. Popeye9700@yahoo.com