BAGA CENTENÁRIA (BB100)
Março 05, 2020
Tarcísio Pacheco
BAGAS DE BELADONA (100)
HELIODORO TARCÍSIO
BAGA CENTENÁRIA – Nos meus tempos de Liceu, basicamente a década de 70, costumávamos festejar os centenários das disciplinas com mais aulas, geralmente Português e Matemática. Pedíamos aos professores, levávamos música e comida e fazíamos uma festinha. Não sei se isso ainda acontece pois abandonei a atividade docente formal em 1992. Consigo recordar-me perfeitamente de um certo centenário em que a música ficou por minha conta e eu levei o meu gira-discos. Entre outros, levei um LP dos BONEY M, um grupo de cantores caribenhos a residir na Europa, que teve grande sucesso nos anos 70 e 80, apesar de se saber que praticava o playback vocal, algo que não era incomum nem assim tão malvisto na época. Um dos seus temas mais conhecidos é, provavelmente, Daddy Cool, uma coisa com uma batida disco, que eu adorava dançar. Eram três moças e um tipo, o Bobby Farrel, na primeira versão do grupo porque depois houve muitas confusões com esta banda. As meninas diziam que eu, com o meu ar amulatado que, até hoje, não encontra suporte genético na história da família, me parecia com o Bobby, o que me deixava todo babado pois o homem era considerado bonito dentro do género (pele escura, lábios grossos, gadelha frisada) e era uma vedeta na época. Eu estava então a começar a perceber que afinal não era um patinho feio e que, não sendo o bonitinho da turma, por quem todas as meninas suspiravam (esse era o Jorge Miguel Azevedo e, de uma forma geral, os branquinhos de cabelo liso e claro) também tinha os meus trunfos. Estava a crescer e a ficar menos inseguro. A descobrir que, afinal, as “beiçanas de preto” tinham o seu mercado mesmo na Terceira da década de 70. E outras coisas negroides também, como vim a perceber mais tarde. Enfim, o Bobby Farrel era mais velho do que eu (nasceu em 1949) e já desencarnou, em 2010, em S. Petersburgo, na Rússia, depois de ter atuado na véspera. Falhou-lhe a batida da máquina. Foi sobretudo um cantor (mesmo que falso), um dançarino e um DJ. Lendo a informação biográfica dele, percebo que tínhamos mais coisas em comum, para além do tom de pele, da boca e do nariz, nomeadamente o gosto pela música e pela dança. E, curiosamente, o amor pelo mar, já que Bobby foi marinheiro na sua ilha natal de Aruba antes de vir para a Europa.
E é com este apontamento histórico que pretendo assinalar a minha Baga n.º 100. Não faltam temas de escrita. O mundo está podre e a desabar à nossa volta. Os Açores, infelizmente, não são exceção, mesmo que o pareçam. Prevejo tempos difíceis. Nenhuma feira de tecnologia me fará mudar de opinião. A tecnologia é importante, mas é não é tudo e nem sequer é o essencial. Deus, se existe, está desaparecido e a maioria das religiões não ajuda em nada, pelo contrário.
Esta série, das Bagas de Beladona, que pretendi livre, crítica e incómoda, mas sobretudo um espelho de alma, está integralmente publicada no meu blogue (popeye9700.blogs.sapo.pt) e iniciou-se em junho de 2015. Sempre fui preguiçoso para escrever, por isso fico contente por ter chegado até aqui. Abordei muitos temas diferentes, com realce para os meus “ódios” de estimação, políticos em geral, partidos políticos, capitalismo, convencionalismo, fanatismo, poluição, a Igreja Católica, Cavaco Silva, Passos Coelho e Paulo Portas, imbecis perigosos como Trump e Bolsonaro, temas “fraturantes” (adoro) como o aborto, o casamento gay e a eutanásia. Desde que passei a publicar o meu endereço eletrónico, recebi muitos emails de apoio e apenas um desagradável, de um tipo que se escondia atrás do pseudónimo de “Special One”, mas que sempre soube quem é, alguém que não apreciou as minhas críticas ao que era mais que evidente e agora é uma certeza, a decadência da tradição da tourada dos estudantes da Terceira. Não tenho qualquer ambição específica, muito menos a de ser herói ou mártir, mas a verdade é que fui insultado na rua e ameaçado de violência física, sempre pela mesma pessoa e apenas por essa, um fascista. E um dia, dei com uma sabotagem no meu barco (um veleiro de cruzeiro) destinada a fazer-me cair ao mar, quando menos o esperasse. Nunca soube quem o fez. Mas também podia ter sido, na altura, algum marido furioso. É uma hipótese.
Por outro lado, é bem frequente que desconhecidos me cumprimentem na rua e me falem das Bagas. Ainda no passado fim de semana, isso aconteceu, por duas vezes. Não escondo que isso é gratificante porque todos os que escrevem o fazem para serem lidos. Se disserem o contrário, estão a mentir. Vou continuar a escrever para esses que gostam de mim e a chatear os outros. Nunca soube bem o que queria. Mas sempre soube que não queria ser mais um na carneirada.popeye9700@yahoo.com