BAGA COMUNISMO NÃO E EIS PORQUÊ (BB153)
Dezembro 22, 2023
Tarcísio Pacheco
imagem em: Communism - Cartoon Gallery (original-political-cartoon.com)
BAGAS DE BELADONA (153)
HELIODORO TARCÍSIO
BAGA COMUNISMO NÃO E EIS PORQUÊ – Em termos de escolhas na vida, a minha atitude foi sempre bem clara e coerente: sempre me assumi como um democrata que perfilha uma ideologia (que não é só política, é também filosófica e ética) de “esquerda”: É verdade que no miserável mundo de hoje, tecnologicamente tão avançado, as ideologias estão moribundas e os sistemas de poder assentam em capitalismo, acumulador, fútil, materialista e ganancioso ou em ditadura, autoritária, materialista e repressiva, ambos poluidores cegos, com controle absoluto das pessoas ou ainda em misturas caricatas dos dois sistemas, como nos casos chinês ou russo (não é por acaso que são tão amigos…).
Por outro lado, ao longo do tempo, a minha reflexão pessoal tem-me levado a reconhecer que jamais seria comunista, por vários motivos. Contudo, o comunismo ou os comunistas não são “maus”. Esse é o tipo de abordagem primária, próprio de mentes ignorantes, como as da América profunda de Trump ou de organizações de extrema-direita, como o Chega português. Na sua origem, o comunismo é uma ideologia extremamente nobre, assente em valores elevados como a igualdade social, a justiça, a fraternidade, a solidariedade e a partilha. Seria absolutamente estúpido dizer-se que esses valores são “maus”. Os filósofos inovadores, de Proudhon a Marx, formularam ideias que eram revolucionárias no seu tempo e que se destinavam a mudar sistemas antigos pela raiz, a acabar com os regimes autoritários, conluiados frequentemente com religiões organizadas. Isso só podia ser feito pela força e pela violência, pelo poder das turbas armadas, apoiadas por grupos militares, porque nem reis nem czares nem os seus generais abdicariam pacificamente do poder. Os processos só podiam ser revolucionários e sangrentos e efetivamente foram-no. Por outro lado, muitos comunistas, sobretudo os teóricos, foram idealistas, sonhadores e utópicos. Para mudar, a Humanidade precisou destas pessoas e dos seus processos revolucionários. Foi assim que fomos passando do sistema do Antigo Regime (o que existia antes da Revolução Francesa cortar cabeças), governado por reis e imperadores, com direitos herdados por nascimento e geralmente abençoados por “Deus”, para sistemas mais ou menos democráticos, governados por comités revolucionários e representantes eleitos daqueles que passariam a ser o poder maior, o chamado “povo”.
Até aqui tudo bem. Pode parecer que não, mas a Humanidade deu grandes saltos em frente, mesmo escorregando em sangue, nomeadamente com a Revolução Francesa de 1789, a Revolução Russa de 1917 ou, porque não, com a mais ou menos pacífica e muito sui generis Revolução dos Cravos de 1974. Podemos ter sido dos últimos a abandonar o fascismo, mas, pelo menos, mostrámos ao mundo como se fazem revoluções com muitas flores e quase sem tiros. Um aparte, isto só mesmo em Portugal, carago, onde a coluna revolucionária de Salgueiro Maia com destino a Lisboa, foi parando nos sinais vermelhos perto da capital. Imagine-se o que seria encher os lançadores de mísseis, os canos dos tanques, as turbinas dos caças, com toneladas de flores e entupir aquilo tudo, na Rússia, na Coreia do Norte, na China, no Irão… utópico, mas lindíssimo… Que cena de Hollywood…
O problema está em que depois de, gloriosa e revolucionariamente instaurado o comunismo, é preciso mantê-lo. E é aqui que a porca torce o rabo, passada a euforia revolucionária. É que a espécie humana, naturalmente, é pouco fraterna ou solidária e muito diferente das comunidades de insetos, como as de formigas. Tem os seus surpreendentes momentos e exceções, é certo, mas, como espécie, somos naturalmente individualistas, egoístas, egocêntricos, agressivos, territoriais, ambiciosos, frequentemente gananciosos, acumuladores e muito competitivos. Basta ver a postura apalermada e acéfala como, na atualidade, pais, educadores e governantes, dizem às crianças e jovens que “o mundo de hoje é muito competitivo e têm de estar preparados” como se isso fosse um mantra forçosamente positivo ou inevitável, uma preciosa lição de vida. A educação deveria estar centrada nos valores da solidariedade e da cooperação e não da competição, como muito bem enunciou Montessori.
É por isso que o comunismo só é funcional em pequenas comunidades que o praticam em liberdade, por convicção, sendo as pessoas livres de permanecer ou sair do sistema, sem repressão nem autoritarismo. Esse é o verdadeiro comunismo e o único funcional, aquele em que as pessoas, de comum acordo e livremente, se organizam para viver em “comunas”, estando subjacente algum tipo de sistema de referência, filosófico ou religioso. Como regime de massas, generalista, simplesmente, o comunismo não funciona, por ser contrário à natureza humana. A história mostra que teve de ser sempre imposto, à força bruta e sangrenta, o que foi levando à implosão dos sistemas ao longo do tempo. Na verdade, já quase não restam regimes ou partidos verdadeiramente comunistas no mundo, independentemente de terem ou não sido substituídos por alguma coisa que preste (raramente o foram). Na chamada “maior democracia do mundo”, os EUA, o comunismo é, desde sempre, demonizado, de forma grosseira e obtusa, por um sistema ferozmente capitalista e bestialmente individualista, que mistura e manipula muito bem a ignorância, o conservadorismo, a hipocrisia, o moralismo, o primitivismo religioso e os instintos mais primários e de que Donald Trump é um belíssimo representante, líder e guru. Na China, o sistema é cada vez mais repugnantemente híbrido e transformou-se numa gigantesca colónia de formigas obedientes e trabalhadoras, em que qualquer dissidência é ferozmente decapitada, ao primeiro sinal de “mijo fora do penico”. E em Portugal temos um Partido Comunista, contraditório e anacrónico que, sob a estimável bandeira da defesa dos interesses dos trabalhadores, teima em reverenciar um sistema que, simplesmente já não existe, cenários e atores, e vai morrendo lentamente. Isso não quer dizer que não faça falta; o ideário comunista é importante num sistema democrático de ideologias múltiplas; tem o seu lugar e o seu papel. Em países como a Venezuela ou a Rússia, temos simplesmente tirania, repressão, corrupção e ditadores patéticos, nada de invulgar na espécie humana. No Irão, temos uma teocracia cruel e impiedosa, absolutamente desprezível, que há de implodir um dia (que pena não ser já para a semana…). E a Coreia do Norte não é nada disto, é um caso à parte, uma feroz ditadura familiar, uma distopia incrível e revoltante, com armamento nuclear, que pode perfeitamente despoletar o fim do planeta e da Humanidade, que só esperaríamos encontrar num filme de ficção científica classe B. É absolutamente arrepiante que seja real. Arrepia-me todos os dias. É por isso que gosto de chamar “leitão” ao Querido Líder (um bucha nuclear, patético e ridículo, que, tal como pai e o avô, nunca passou um dia que fosse a fome que impõe ao seu povo), embora me custe ofender os suínos, perfeitamente inocentes e vítimas diárias nos matadouros do sistema.
Então, meus amigos, é isto, por estes motivos, comunismo não, obrigado. Mas também, para mim, capitalismo não, neoliberalismo não, direita não, extrema-direita ainda menos, religiões, estou fora, sou agnóstico e espiritualista, violência, nunca, competição deixa-me indiferente, não sou um bicho da selva. Na verdade, parece-me que o que eu gosto, o que eu queria, não é deste mundo. POPEYE9700@YAHOO.COM