BAGAS ESTRANGULAMENTO DA SILVEIRA / EUTANÁSIA (BB 99)
Fevereiro 27, 2020
Tarcísio Pacheco
imagem em: https://almayasabdam.com/right-to-die-could-be-an-option-catholic-hospitals/
BAGAS DE BELADONA (99)
HELIODORO TARCÍSIO
Entrei em modo de Carnaval. Se vivesse no Brasil estava numa escola de samba de certezinha absoluta, de tanga e penas de pavão e com um pandeiro na mão. Por cá, demorei, mas acabei por tomar o gosto de tocar num bailinho. Bom, então vou adiantar duas singelas Bagas porque de hoje até quarta de Cinzas é para curtir e dormir. Há de se reservar algo mais estruturado para a Baga centenária.
BAGA ESTRANGULAMENTO DA SILVEIRA – Não sou muito de gastar papel e tinta com questiúnculas locais. Mas como cidadão e utente diário, não posso deixar de lastimar o horroroso estado do troço de estrada entre os portões de S. Pedro e a Silveira. Nisso, acredito que a Terceira esteja à frente, no prémio da pior via urbana dos Açores. O estado daquela via, quiçá a mais usada da ilha, é inacreditável. No fim desse troço, saindo da cidade, está o que também deve ser o pior estrangulamento de trânsito da ilha. Ao pouco espaço de circulação junta-se o estacionamento ilegal, mas constante, devido aos cafés e minimercados da zona. Agora que se está a finalizar um novo parque de estacionamento ali bem perto, espero que as autoridades tenham, para aquele local, um plano de reparação, organização e disciplina de estacionamento e circulação. Na minha humilde opinião, eis o que deveria ser feito: reparação (urgente mas com qualidade, por favor) do pavimento; interdição absoluta de estacionamento na zona do João da Silveira; obrigação de utilizar um dos 3 parques de estacionamento vizinhos; não bastando interditar com sinais de trânsito, já que o povo evacua para eles e a PSP não chega para as encomendas, o que há a fazer é alargar significativamente o minúsculo passeio do lado norte e colocar os imprescindíveis dissuasores de estacionamento, deixando apenas dois canais para circulação do trânsito em ambos os sentidos. O mesmo se aplica ao passeio para peões a partir do João da Silveira, sempre ocupado por estacionamento selvagem. Quando não há parques, ainda se entende. Havendo parques nas proximidades, é forçoso que as pessoas se comportem civilizadamente. A bem ou a mal.
BAGA EUTANÁSIA – Escrevi no Diário Insular sobre a eutanásia em 2010, 2017 e em maio e junho de 2018. Argumentei o suficiente. Não pretendo repetir-me. No momento em que a Assembleia da República aprovou a despenalização da morte assistida na generalidade, facto que me satisfaz muito, pretendo apenas reafirmar que a minha escolha pessoal continua a ser a da concordância com a eutanásia. Esta é uma questão cultural, filosófica, científica, ética, religiosa e profundamente humana. Parece-me terrível sermos forçados a uma decisão dessas ou ver alguém que nos é querido ser forçado a tomá-la. O ideal seria que isso não acontecesse a ninguém. O ideal seria não sofrermos. O ideal seria não termos que morrer. Mas isso não é uma escolha nossa, pois não? Todos adquirimos esse conhecimento, sobre a morte, desde muito cedo. E a maioria de nós vive para esquecer esse dia que inevitavelmente chegará. Poder, ao menos escolher quando e como partimos, em determinadas circunstâncias, muito específicas, pareceu-me sempre bastante justo e a questão mais pessoal das nossas vidas.
Parece-me assaz curioso que a religião católica, que acredita que um Deus criou o mundo e a raça humana como bem quis e entendeu, defenda que “não matar é um princípio básico da moral natural”. Se foi Deus quem criou tudo, então criou um tipo de vida em que o morticínio é diário, constante e natural. A moral natural é matar todos os dias, seja lá o que for, animal, vegetal, outros seres humanos, em nome da nossa própria sobrevivência. Estamos neste mundo para nos devorarmos uns aos outros, sendo que os mais fortes ficam para o fim. Além disso, Deus, se foi Ele o responsável, se é que há UM responsável, criou-nos com códigos genéticos que nos forçam a envelhecer, adoecer e morrer. Equipou-nos também com um cérebro de elevado potencial que logo tomou conhecimento da morte e especulou sobre ela. Nestas condições, parece-me inteiramente justo que, usando o nosso famoso livre arbítrio, pelo menos, adquiramos um mínimo de controle sobre o processo.
Quero salientar ainda duas hipocrisias: uma, não temos de debater muito mais porque, claramente, a sociedade anda a debater esta questão há vários anos; outra, os políticos que agora exigiam um referendo (figura jurídica muito do meu agrado) são os mesmos que ainda há bem poucos anos, quando a direita estava no poder amancebada com a extrema direita, achavam que não era preciso. Não há pachorra.
Finalmente, quero afirmar que acredito termos dado um passo importante na evolução da nossa sociedade. E que também acredito que os mais fundamentais valores humanos serão respeitados. Que o processo de requerimento do suicídio assistido decorrerá como deve, bem estruturado, com regras bem definidas, não necessariamente muito moroso (senão as pessoas em sofrimento morrem à espera) mas totalmente blindado contra os abusos, os crimes, a vileza de que tanta gente é capaz e a apropriação pelo sistema capitalista.
Podia ficar o dia inteiro a escrever sobre isto. Mas agora, vou para o Carnaval, aproveitar enquanto estou bem vivo e aos pulos. popeye9700@yahoo.com