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popeye9700

Crónicas e artigos de opinião, a maior parte publicada no Diário Insular, de Angra do Heroísmo.

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Crónicas e artigos de opinião, a maior parte publicada no Diário Insular, de Angra do Heroísmo.

S. FRANCISCO NÃO TINHA UMBIGO?

Outubro 01, 2014

Tarcísio Pacheco

(imagem em http://www.pinterest.com/chrissfo/franciscan/)

 

S.FRANCISCO NÃO TINHA UMBIGO ?

 

A discussão sobre a Igreja de S. Francisco deixou os becos escusos onde rasteja a gente comum, que se insulta e se morde, para se elevar às esferas superiores, por onde flutuam as “pessoas de bem” escutando música celestial que não se consegue dançar.

No entanto, a plebe ordinária ainda pode ter qualquer coisa a dizer. A Diocese  sempre tolerou mal que qualquer atividade não religiosa fosse realizada na Igreja de S. Francisco, com excepção de exposições de arte sacra, recitais de música sacra, concertos de música clássica e quando muito um fadinho mas, olha lá,  nada de fado brejeiro. E talvez um workshop de doçaria conventual. Com papos de anjo, os favoritos do clero católico. Obviamente,  quando um antigo responsável diz que, antes de realizar uma atividade na Igreja,  submetia o programa à autoridade eclesiástica por uma questão de bom senso, estava a referir-se ao “seu” próprio conceito de bom senso. Acresce que, nesse caso,  não passava de uma formalidade hipócrita, uma vez que,  sob aquela direção,  não havia criatividade, arrojo ou diferença que permitisse planear qualquer evento minimamente “suspeito”. Outros responsáveis agiram de modo completamente diferente e com certeza não tinham enviado o bom senso para umas férias em Cancún.

A Constituição Portuguesa institui a liberdade religiosa. Por isso, não é preciso ser católico para se ser responsável por um espaço público. Na mesma ordem de ideias, a glória de Deus não me parece ser para aqui chamada. Tenho até sérias dúvidas se Deus não estará muito mais preocupado com o aquecimento global na Terra, do que com a Sua glória. Eu, pelo menos, embora agnóstico, prefiro pensar num Deus mais preocupado com a porcaria que a Humanidade tem feito do que com o seu umbigo. Ops, eu disse “umbigo”? Fugiu-me a boca para lá. Não terá sido a primeira vez.  Um Deus cansado de cruzes, franciscanas ou não,  talvez prefira distrair-se com uns minutos de dança do ventre e tenha  um sorriso tolerante e até apreciador perante a visão celestial de um belo umbigo, que afinal, Ele próprio criou. Para Sua glória. Sem contar que, cruzes, talvez Lhe despertem más recordações, digo eu.

É reconfortante e até revelador ler que uma igreja é uma igreja. Com efeito, trata-se de matéria capaz de gerar confusão. Tendo em conta a história da Igreja Católica ao longo dos séculos, uma igreja podia realmente ser um mercado, um tribunal, um evento da Moda Lisboa, um bordel, uma sala de interrogatórios da KGB ou uma churrasqueira. Nada como dizer uma coisa inteligente que põe tudo em pratos limpos.

Por falar em pratos, o museu de Angra nunca organizou na igreja anexa workshops de sushi, bares de gin ou projeções de filmes com cenas explícitas de sexo. Isto, claro porque os seus responsáveis têm bom senso, embora se trate apenas do deles. Toda a gente sabe o que pode acontecer quando pessoas que não são de bem vêem um filme de pouca vergonha, em cima de uma talhada de salmão cru empurrada com  um shot de gin. Mas o museu organizou uma curta demonstração  de dança do ventre. Na sua inocência, o museu nunca pensou que Deus fosse ficar de trombas ou sentisse a sua gloria afetada. Isso revelaria insegurança, impensável no caso de Deus. Nem o museu se lembrou de perguntar primeiro ao Bispo. O atual prelado tem fama de bonzinho, quem sabe se não teria até autorizado desde que a Telminha tapasse o lindo umbigo com fita-cola cinzenta, daquela extra large.

No atual edifício de S. Francisco, a memória do antigo convento está representada de diversas formas, o que é um pouquinho mais substancial que “nada”: a memória arquitetónica está lá toda, o antigo convento  ocupa largo espaço na exposição de longa duração “Memórias do Edifício”; temos o claustro e os antigos refeitórios dos frades bem como a antiga cozinha e chaminé  que são diretamente acessíveis ao público; na reserva de cerâmica, foram preservadas as janelas das antigas celas monásticas; a igreja permanece como sempre foi.

Por outro lado, não vejo qualquer problema histórico na profanação desta igreja. Trata-se de uma igreja que sempre fez parte de um convento extinto em 1834.  Um acordo permitiu que esta igreja continuasse a receber culto enquanto houve clientes para o negócio das almas. Agora que os fieis estão procurados, esta igreja pôs-se mesmo a jeito para uma profanaçãozinha. Nunca deixará de ser uma igreja na sua essência e, tendo em conta a sua história, uma pequena exposição de longa duração sobre o franciscanismo seria interessante. A minha ideia não é abrir lá uma delegação do Folies Bergéres. Se bem que esteja inteiramente de acordo com os festivais de cinema; nesta igreja ou em qualquer outra, teriam pleno cabimento um ciclo do realizador Pier Paolo Pasolini ou um festival temático, dedicado à sodomia, por exemplo.

Acho que se deve resolver definitivamente a questão, de uma forma ou de outra, para acabar de vez com estas cenas gagas. Conheço a Concordata e o parecer de Álvaro Monjardino. O atual cenário legal não parece permitir a realização de quaisquer eventos que não sejam de culto católico. Havia um acordo, clamarão alguns. Pois sim, eu também adoro acordos, sou todo da paz e do amor. Porém, este acordo não está a funcionar. Entendam-se, os que mandam. Mas lembrem-se que nada é de graça. Só os sorrisos. É por isso que eu ainda me estou a rir disto tudo. POPEYE9700@YAHOO.COM

 

 

 

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