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popeye9700

Crónicas e artigos de opinião, a maior parte publicada no Diário Insular, de Angra do Heroísmo.

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A VIDA DIFÍCIL DE UM ECONOMISTA CRISTÃO

Novembro 27, 2013

Tarcísio Pacheco

 

 

IMAGEM: http://pantominocracia.blogspot.pt

 

 

Sou forçado a concluir que o economista João César das Neves (JCN) não joga com o baralho todo. Ninguém me tira isto da cabeça. É uma explicação que faz mais sentido do que pensar que ele é uma pessoa má. Ele nem parece uma pessoa má. Podia ser meu primo distante ou vizinho de andar e tem um belo cabelo grisalho que eu invejo profundamente. Já a pera à D’Artagnan não aprecio mas são gostos. Reconheço que ele ficaria bonitão com um belo chapéu de pena rubra e um daqueles bibes XXL que os mosqueteiros usavam (para não se sujarem com o sangue das vítimas que trepassavam). Se fosse mulher até aceitaria beijá-lo. Se fosse homossexual também mas era só para o chatear. Achá-lo tosco é mais misericordioso do que confrontá-lo com a incoerência entre as suas posições públicas e a sua bem conhecida condição de católico ultra ortodoxo. Apesar de Francisco Louçã ter toda a paciência do mundo para lhe explicar calmamente como as coisas verdadeiramente funcionam, vê-se que ele não entende, coitado. E fica zangado, altera-se, esbraceja. Também pode ser uma Alzheimer precoce, acontece aos melhores. Mas isso, o santinho João Paulo II cura. Basta pedir com muita força como se estivéssemos na privada com uma crise de obstipação. Eu disse crise? Desculpem lá.

A incoerência começa logo porque me parece complicado ser cristão ultra ortodoxo e economista. Um cristão luso deve seguir Jesus, seja lá quais forem as voltas que ele se lembre de dar, nem que seja caminhar ali sobre a lagoa de Óbidos. E ele tornou-se um bocado vagabundo, depois de ter trocado a honesta profissão de carpinteiro pela duvidosa atividade de fazedor de milagres. Mas um economista luso deve seguir o FMI, o Banco Central Europeu, a Comissão Europeia e os mercados. O que é complicado porque é muita gente e nunca se sabe bem onde param. Tanto podem estar em Berlim a tomar chá de bexiga de sapo com a Merkel, em Wall Street a tomar um malte velho nos seus gabinetes envidraçados  ou  a matar elefantes e leões na África do Sul, com membros da realeza europeia e apresentadores de TV. Convenhamos que não é fácil e talvez seja por isso que o pobre anda confuso.

Ultimamente, têm-se multiplicado as análises à economia portuguesa. Algumas pessoas complicam, como Francisco Louçã, que fala da impossibilidade de pagar a dívida portuguesa, do imperativo da sua reestruturação, da necessidade de crescimento económico sem descapitalização das pessoas etc. Tudo coisas absurdas, malícias de comunista démodé. Já JCN, com aquela cabeça genial, mostra como é possível simplificar. O programa de austeridade  não funcionou simplesmente porque nunca chegou a ser verdadeiramente aplicado. Sempre que houve um avanço no fabuloso Caminho Certo, essa magnífica auto-estrada, cheia de portagens e rendas que se inicia em Bruxelas, passa no Hotel Califórnia e mergulha no canhão da Nazaré, apareceram forças de bloqueio. Aqui,  JCN entende por avanços tudo o que se enquadra na descapitalização das pessoas, como cortes em salários e pensões e subidas de impostos. E por forças de bloqueio, à cabeça, os membros disfarçados de juízes de uma quadrilha que dá pelo nome de Tribunal Constitucional mas também funcionários públicos, médicos, enfermeiros, professores, polícias, reformados, pensionistas, militares, polícias, artistas, músicos, pescadores, operários, caixeiros, estivadores  e falsos pobres. Na verdade, é impressionante, quase toda a gente se entretém a bloquear o país. Que gentinha difícil de governar…Só não o tem feito os membros da coligação governamental, os seus deputados, os amigos e familiares, os empresários e banqueiros, os doentes acamados, os futebolistas, os falecidos e JCN. Eusébio falou mas ninguém entendeu nada e José Castelo Branco mandou um mail a garantir que não é homossexual mas que alguns membros do Governo são muito giros. Sempre que está tudo a ir tão bem…pumba, lá aparece alguém a defender o seu… (palavras de JCN) ou a fingir que é pobre. Povo ingrato que não se quer deixar salvar… Na verdade, o grande argumento de JCN, imbatível,  é que, pronto, devemos e temos de pagar aqueles senhores amáveis dos mercados, que até têm tido uma extraordinária paciência com a gente. E que, em tempos de exceção, as pessoas têm de perder essa mania de comer todos os dias e ter Constituições, que só dão emprego a Constitucionalistas.

Bom, seja como for, não vejo grandes motivos para JCN andar abespinhado. Bem vistas as coisas, não há governo mais cristão que este. O vice-primeiro ministro é um conhecido papa-hóstias, um coração de ouro,  que rouba os velhinhos, é certo, para bem do país mas fá-lo desolado e com lágrimas nos olhos. Como o dinheiro corrompe e é imoral, não há nada mais cristão do que tirá-lo aos outros, que fazem mau uso dele, não pagando dívidas, por exemplo. Deve estar em qualquer lado na Bíblia, pagar as dívidas aos mercados senão Deus manda raios, pedras e gafanhotos. Com Deus não se brinca. E os mercados também têm bocas para alimentar ou julgam que é só golf? Já viram o preço atual do caviar?

Além disso, este Governo também é cristão porque tem conseguido realizar verdadeiros milagres, nomeadamente o complicado truque da multiplicação, uma técnica difícil que Jesus só pode ter aprendido com o Pai. Em pouco tempo conseguiu multiplicar os desempregados, o passivo acumulado, as falências, os emigrantes, as greves, os tumultos, os assaltos, os suicídios, os ódios, os inimigos e as ocupações de escadarias. Só não conseguiu ainda multiplicar pão e peixe. É uma pena. POPEYE9700@YAHOO.COM

 

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