SARACOTEIO E BLA BLA BLA
Agosto 05, 2013
Tarcísio Pacheco
Às vezes, a inspiração brota dos mananciais mais inesperados. Na manhã do domingo, 4 de Agosto, numa deambulação sonolenta (com sono e lenta) pelos feeds do Facebook, enquanto a minha bebé Juju, sentada na sua cadeirinha, comia bolinhas de milho com mel e via três alegres abelhas a dançar na Baby TV, deparei com um link para uma pérola musical, Blá Blá, da autoria duma alma sertaneja em férias no litoral, chamada João Claúdio. O link é http://www.tabonito.pt/uma-musica-impossivel-de-ouvir-so-para-duros . Só vos posso dizer, infelizes leitores, que é brutal! Tem tudo para ser o hit do summer 2013. Uma lírica rica e inspiradora e uma música que nos entra no ouvido e nos faz de imediato procurar uma embalagem de cotonetes Extra Large na primeira farmácia de serviço. Lembra-me aquela moça inglesa que foi passar férias ao Perú e voltou para casa com um alegre condomínio de larvas de mosca no ouvido interno. João Cláudio e o seu Blá Blá tem tudo para ser viral. Aliás, em muitos aspetos, esta fabulosa música tem pinta de vírus. Talvez por isso mesmo me lembre Passos Coelho, sobretudo na parte do Blá Blá Blá. Dantes, a minha referência para Passos Coelho era Cyrus the Virus, a personagem de John Malkovitch no filme “Conan Air, a Fortaleza Voadora”, embora Cyrus seja bastante mais inteligente. Mas a gente tem de se atualizar. As coisas mudam. Por exemplo, pensávamos que íamos receber sempre um ordenado minimamente decente pelo nosso trabalho. Isso era dantes, quando éramos socialistas endividados e vivíamos acima das nossas possibilidades. Só para dar um exemplo, aqui na ilha temos até um Ferrari quando o nosso nível é mais o do carro indiano de plástico. Agora, acabou-se o que era doce. Continuamos endividados, perceber onde vamos parar é questão de física quântica, sendo que o único dado seguro é que a direcção é para baixo mas, pelo menos, sabemos quando vamos terminar de pagar a dívida. É no final do quinto mês da Eternidade. Paulo Portas diz que isso é irrevogável. Podemos, portanto, dormir descansados. Voltando ao Blá Blá, a mocinha, que até é gira e merece, no mínimo, chegar a funkeira, lembra-me Paulo Portas. Não sei porquê, talvez por ter cara de gostar de velhinhas, de feiras e de garbosos marinheiros de submarinos. Mas o que nos fica mesmo na retina, já que no ouvido os cotonetes resolvem, é o jeitinho de João Cláudio para a dança. Qual Lydia Barloff, qual carapuça! Aquilo é balanço do bom. Podia ser ainda melhor, que pena ele ter passado a cerca de 3.000 km de uma formação em dança clássica. Mesmo assim, aquele saracoteado impressiona. É um pouco complexo e difícil de aprender, mas quando, finalmente, se domina a técnica, não se quer outra coisa . É como beijinhos de côco com chocolate, é impossível comer só um. E tem aquele momento de intensa sensualidade em que o João beija a moça na melhor tradição do macho latino e em seguida, num movimento fulgurante, que os olhos mal acompanham, ela lhe arranca as calças. É de arrepiar e muito bem ensaiado. Os comentários a este vídeoclip também são profundamente interessantes. Por exemplo, a propósito de um comentário maldoso sobre a diferença de idades entre o bom do João e a mocinha (que até pode muito bem ser uma prima dele), a Inês Loureiro diz que foi a primeira coisa em que pensou, PEDOFOLIA (sic). Acho que devíamos adotar este termo, muito mais descritivo, afinal não deixa de ser uma espécie de folia, mesmo que ilegal, desprezível e eticamente condenável. E talvez seja mesmo a única espécie de folia apreciada pela Igreja Católica, já que eles não são muito de folias. E está certo, uma vez que, aparentemente, Jesus não veio ao mundo para se divertir. Consta que era boa pessoa mas algo macambúzio e de ideias fixas.
Depois de se ver este vídeoclip não se consegue deixar de saracotear, esteja-se em casa, na paragem do autocarro, na fila do supermercado ou no consultório do dentista. Passos Coelho aparece na TV a dizer que agora a crise chegou às proximidades das antevésperas do primeiro terço do início gradual do princípio do fim à vista e a gente, saracoteio e blá blá blá. Paulo Portas aparece na TV a dizer que não consegue dormir de noite por causa das velhinhas com fome e que tomou uma decisão irrevogável e a gente, saracoteio e blá blá blá. Rui Machete aparece na TV a dizer que nunca fez nada de errado, que até é um tipo fixe e que não tem culpa nenhuma de, um dia, uma corrente de ar lhe ter feito entrar pela janela acções a preço de saldo e a gente, saracoteio e blá blá blá. Maria Luísa Albuquerque aparece na TV a dizer que as informações nos mails que recebeu sobre os contratos swap vinham em letra muito miudinha e a gente, saracoteio e blá blá blá. Cavaco Silva aparece na TV a dizer que até é inteligente, que não sabe o que é o BPN, que sempre foi cliente da Caixa Agrícola de Boliqueime, que a estabilidade política é o maior bem sobre a Terra depois da água e dos figos passados do Algarve comidos de boca cheia e a gente, saracoteio e blá blá blá.
Acho que isto do Blá Blá Blá apareceu porque deixei de escrever. Quando voltei à Terceira, tinha mesmo um monte de fãs à minha espera com um cartaz, que dizia “Mas porque é que tu não escreves mais ó Heliodoro Tarcísio??”. Foi então que eu lhes disse “Meus amados fãs, é que eu tomei uma decisão irrevogável, nunca mais escrever sobre política e é impossível não escrever sobre politica na atualidade; além disso, gosto mais do Brasil do que da política e a minha namorada atrai-me muito mais que Paulo Portas, apesar dele ficar deveras atraente de cabeleira loura”. Eles começaram a chorar, lamentosos e eu, para os consolar e porque não tinha ali nenhum milagre ali à mão e já tinha acabado com todos os chocolates, atirei-lhes com uma última justificação: além disso, vejam bem, George Orwell já fez isso quando escreveu o seu “ O Triunfo dos Porcos”e não consigo fazer melhor que ele. POPEYE9700@YAHOO.COM